Enfrentar a pobreza menstrual de forma inclusiva e com materiais sustentáveis está entre os objetivos do projeto Neutron. Nesta iniciativa, universitários da Universidade Federal Fluminense (UFF) trabalham no desenvolvimento de um short absorvente. O objeto é capaz de atender tanto a mulheres cisgêneras quanto a pessoas transexuais que menstruam.
A iniciativa é um projeto do Time Enactus da UFF de Volta Redonda, no Sul Fluminense. O grupo é composto por alunos do campus que desenvolvem projetos em parceria com a organização internacional dedicada ao empreendedorismo social.
A líder do Neutron e aluna de Direito na UFF, Ana Mattos, explicou à Agência Brasil que “a proposta é melhorar a saúde e bem-estar de pessoas trans que menstruam, além de amenizar a disforia de gênero”, que é o sentimento de angústia em relação ao próprio corpo ou à forma que alguém é interpretado socialmente. Isso acontece a partir da acessibilidade a produtos inclusivos, confortáveis e que proporcionam um ciclo digno e sem constrangimento.
Alunos da UFF querem proporcionar maior dignididade
Pobreza menstrual é um conceito que se refere à falta de acesso a produtos de higiene adequados, a informações sobre saúde menstrual e a condições dignas para gerenciar esse ciclo de forma saudável e segura. Para pessoas transgêneros, a associação desse processo exclusivamente à identidade de gênero feminina. A ausência de itens neutros agravam esse fenômeno entre homens trans, pessoas não-binárias e intersexo que menstruam.
Para Ana Mattos, o problema é uma “realidade negligenciada no Brasil, afetando pessoas que passam por esse processo natural do corpo todos os meses”. Segundo a líder do projeto, “a falta de acesso à higiene básica durante esses períodos pode ter consequências devastadoras para a saúde física, emocional e social, visto que a falta de dignidade nesse processo e a inexistência de amparo público ocasiona uma marginalização de quem enfrenta essa situação”.
“É importante reconhecer que a pobreza menstrual não afeta apenas mulheres cisgêneras, mas qualquer pessoa que menstrue. É uma realidade ainda mais grave para pessoas trans em situação de vulnerabilidade socioeconômica”, observa a participante do Time Enactus UFF Volta Redonda.
Ela também observou que “o sofrimento causado pela associação da menstruação ao feminino pode levar a uma intensa disforia de gênero”. “Além disso, o alto custo de terapia hormonal e a dificuldade no acesso a informações agravam a pobreza menstrual para pessoas trans. No Brasil, país que mais mata pessoas trans no mundo, esta é uma problemática urgente”, concluiu.
Absorventes produzidos pelos alunos da UFF são inclusivos e reutilizáveis
A poluição ambiental devido ao descarte de absorventes é mais uma questão considerada ao elaborar os shorts absorventes. Eles são compostos de tecidos hipoalergênicos, com camadas absorventes para fluxos leve, moderado e intenso. “Nossa proposta é não só promover a menstruação inclusiva e neutra, mas também o ciclo menstrual sustentável, evitando o descarte de toneladas de absorventes de plástico no meio ambiente. O uso de produtos menstruais reutilizáveis também tem se mostrado uma opção mais econômica, visto que os mesmos shorts absorventes poderão ser utilizados por bastante tempo”, afirma.
Segundo dados levantados pelo Instituto Akatu, uma única pessoa pode gerar cerca de 200 quilos de lixo apenas em absorventes descartáveis. O plástico, que leva em média 450 anos para se decompor no ambiente, corresponde a boa parte desse material.
“O destino do nosso lixo não reciclável é ir para aterro sanitário ou lixão. Absorventes menstruais são feitos basicamente de 90% de plástico. Este tipo demora até 500 anos para serem degradados, isso se considerar aterros sanitários e condições ideais”, explica o professor de Direito da UFF de Volta Redonda e conselheiro do Time Enactus UFF, Leonardo Costa de Paula.
Projeto da UFF está em fase inicial
Mattos conta que os shorts absorventes estão atualmente em fase de criação e teste. Dois modelos já foram experimentados. Agora a equipe trabalha na confecção da peça final, que poderá ser comercializada e utilizada para doações.
O processo de criação foi feito em parceria com uma pesquisadora de moda inclusiva e professora de modelagem do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac), Ana Luiza Garritano, com a designer de moda e estilista, Mayara Peixoto.
Parcerias para expandir iniciativa da UFF
O projeto busca apoio do Programa Estadual Rio Sem LGBTfobia no contato com a comunidade trans e na preparação das peças.
“Em parceria com o programa, iremos doar uma quantidade de shorts absorventes para o público transgênero apoiado pelo Centro de Cidadania LGBTI+ Médio Paraíba. Inicialmente quatro cidades do estado do Rio de Janeiro serão beneficiadas. Futuramente, planejamos expandir esse impacto para outras cidades e regiões do Brasil. Além disso, em breve o projeto terá uma plataforma virtual para venda dos produtos. Isso vai possibilitar que qualquer pessoa do país garanta a sua peça”, explicou.
O professor Costa de Paula valia que o Estado pode criar isenções e incentivos para produtos inovadores, reutilizáveis e biodegradáveis para a menstruação.
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