Termos como reciclagem e sustentabilidade fazem parte de qualquer discussão sobre o cuidado com o planeta. Mas na prática o caminho a ser percorrido ainda é longo. Para se ter uma ideia do cenário, a região do Norte Fluminense perde anualmente R$ 43,1 milhões em materiais que poderiam ir para a reciclagem e assim gerar recursos para os municípios.
A constatação é do “Mapeamento dos Fluxos de Recicláveis Pós-Consumo no Estado do Rio de Janeiro – Norte Fluminense”, realizado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), que tem o objetivo de contribuir para o fortalecimento do ciclo de reciclagem e seus impactos econômicos, sociais e ambientais. Segundo o estudo, a estimativa é de que a região enviou para aterros sanitários 98 mil toneladas de resíduos que poderiam seguir para reciclagem.
O Mapeamento identificou ainda que a geração de resíduos sólidos urbanos no Norte Fluminense mais do que dobrou de 2019 a 2020. No período, o volume de resíduos sólidos urbanos (RSU) coletado na região saiu de 237 mil toneladas para 499 mil (+110,7%). Há de levar em consideração, no entanto, que as realidades de cada município são bem distintas. Campos dos Goytacazes, a maior cidade da região, coletou 300 mil toneladas (+189,4%), e Macaé 156 mil (+95,7%). Já Carapebus e São Fidélis reduziram para mais da metade a quantidade recolhida de um ano para outro – respectivamente, 2,6 mil (-66,9%) e 4,4 mil (-58,4%).
“O ciclo da reciclagem é mais do que um mercado milionário: é uma necessidade urgente que preserva o meio ambiente e promove melhoria nas condições de vidas das pessoas. Mas para isso é preciso atuar em conjunto, e assim desenvolver toda a cadeia produtiva da reciclagem”, destacou o presidente da Firjan Norte Fluminense, Francisco Roberto de Siqueira.
O estudo também identificou um percentual significativo da população não atendida pela coleta regular de resíduos sólidos urbanos: Cardoso Moreira tem nada menos que 30,5%, seguido por São Fidélis (21%) e Carapebus (9,6%). São Fidélis ainda declarou encaminhar parte do RSU para um lixão em 2020 (580 toneladas em um mês). Em 2021, este ponto de descarte da cidade passou a constar como inativo, segundo o mapa da Situação dos Aterros Sanitários da Secretaria Estadual do Ambiente e Sustentabilidade (SEAS).
Sem coleta seletiva, sem reciclagem
Ainda de acordo com a pesquisa, há falta de informações sobre coleta seletiva. Apenas duas cidades declararam realizar alguma modalidade: Campos e Carapebus. O número deixa o índice regional em 0,5% do total de resíduos urbanos coletados – a mesma média estadual, considerada baixa.
Das duas cidades, apenas Campos declarou o volume coletado em 2020 (2.691 toneladas), e nenhum município informou realizar coleta seletiva de porta em porta. O estudo conclui que “a inexistência de cooperativas de catadores formais pode estar relacionada à baixa adesão do poder público a modelos de coleta seletiva”.
“O volume gerado do resíduo sólido urbano é bem expressivo e merece atenção pelo seu grande potencial de aproveitamento e redução dos impactos ambientais”, destaca Carolina Zoccoli, especialista em Sustentabilidade da Firjan.
O mapeamento aponta que é preciso criar uma rede de infraestrutura e incentivar negócios que viabilizem a triagem dos resíduos e o beneficiamento para que os materiais pós-consumo tenham a melhor destinação possível.
As recomendações, entre outras, são a criação de incentivos para a segregação do reciclável na origem, a desburocratização das atividades relacionadas à reciclagem, o desenvolvimento de ações para a formalização dos atores da cadeia da reciclagem e ações para atração de novos investimentos no setor.
Região exportadora de resíduos recicláveis
O estudo mostra que as empresas do Norte Fluminense geraram cerca de 7,9% dos resíduos pós-consumo oriundos de grandes geradores do estado. Considerando-se apenas os materiais segregados por tipo (metal, papel e papelão, plástico e vidro), a região responde por 10,4% da geração, atrás apenas da capital e de Duque de Caxias e Região. Apesar disso, o Norte Fluminense processa apenas cerca de metade do volume gerado, o que faz da região uma grande exportadora de materiais que poderiam ser reaproveitados para gerar riqueza aos municípios da região.
Ao gerar um volume maior que o limite determinado pelo município para se enquadrar na coleta pública, as empresas devem contratar um serviço particular para fazer o descarte. “É muito importante as empresas destinarem separadamente os resíduos para que o setor de reciclagem os recupere. Se a empresa se organiza para separar os recicláveis gerados nos seus ambientes administrativos, por exemplo, e encaminhá-los para cooperativas de reciclagem, ela vai reduzir o volume pelo qual precisa pagar para destinar pela coleta terceirizada”, acrescenta Renata Rocha, analista de Sustentabilidade da Firjan.
A conclusão do estudo é que “o estabelecimento de cooperativas e a identificação de indústrias capazes de internalizar os recicláveis em seus processos produtivos pode aumentar o aproveitamento desse material, com benefícios ambientais e econômicos”.
O mapeamento faz parte de um aprofundamento de estudo da Firjan divulgado no ano passado, que revelou que o estado do Rio enterra anualmente R$ 1 bilhão em materiais que poderiam seguir para a reciclagem. O percentual de municípios que reportaram dados sobre resíduos às bases de dados oficiais subiu de 69,57%, em 2019, para 91,30%, em 2020.
Realizado com base em dados públicos oficiais de órgãos ambientais, o estudo investigou a trajetória dos recicláveis pós-consumo (ou seja, materiais que saíram do ambiente produtivo e tornaram-se resíduos após o uso final, provenientes tanto de domicílios como de geradores empresariais). Com isso, a intenção é fornecer – aos investidores, gestores empresariais, formuladores de políticas públicas e outros tomadores de decisão – subsídios para a transformação do Rio em um estado reciclador e valorizador do material pós-consumo descartado.
Os resultados já foram apresentados nas representações regionais da Firjan Centro-Sul e Nova Iguaçu e serão levados também para todas as regiões. O setor empresarial poderá sugerir boas práticas que possam ser compartilhadas entre as regiões. “Estamos trabalhando na divulgação e debate dos resultados junto a formadores de opinião e formuladores de políticas. Nos fóruns em que temos assento, temos incluído aprimoramentos em normas e regulamentos que desburocratizam as etapas da reciclagem no estado”, informa Isaac Plachta, presidente do Conselho o Empresarial de Meio Ambiente da Firjan.
O estudo estava previsto no Caderno Regional de Ações Prioritárias para o Desenvolvimento do Norte Fluminense, que reúne o posicionamento do Conselho Empresarial da Firjan Norte e as propostas para o desenvolvimento da região de 2021 a 2024. O estudo completo está disponível no link: www.firjan.com.br/reciclagem