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Opinião

Morro do Castelo, um eterno tesouro da história fluminense

Na estreia da Coluna Conexão Histórica, os historiadores Antonio Edmilson Martins e Luciene Carris discorrem sobre o valioso Morro do Castelo.

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07 de julho de 2022
Morro do Castelo, um eterno tesouro da história fluminense
O Morro do Castelo foi demolido em 1922 em uma decisão "para inglês ver". Crédito: Brasiliana Fotográfica

Por Antonio Edmilson Martins Rodrigues e Luciene Carris

O Centro Histórico do Rio de Janeiro guarda algumas preciosidades sobre uma cidade que está em constante transformação. Um transeunte que eventualmente caminha pela Esplanada no Castelo, e se depara com as avenidas Presidente Antônio Carlos, Presidente Wilson e Graça Aranha, não perceberá que bem ali existiu o Morro do Castelo com cerca de 63 metros de altura, que se estendia por um espaço de quatro mil metros quadrados, e cujos limites eram a avenida Rio Branco e as ruas Santa Luzia, Misericórdia e São José.

Em 1920, a convite do presidente Epitácio Pessoa, o engenheiro Carlos Sampaio assumiu a prefeitura com a missão de preparar a cidade para as comemorações do Primeiro Centenário da Independência que ocorreria em 1922. Apesar do curto período para tantas intervenções, dos poucos recursos financeiros disponíveis e de uma oposição política implacável, o prefeito realizou obras de grande relevância para a cidade. Coube ao prefeito Carlos Sampaio a façanha de erradicar o morro do Castelo através do uso de escavadeiras e de golpes de jatos d´água.

Desde o século XVI até o seu arrasamento em 1922, o morro, berço inaugural da cidade, recebeu diferentes nomes, como morro do Descanso, de São Tiago, de São Januário, de São Sebastião, e, por fim, Castelo. Ali foram construídos a igreja de São Sebastião, o colégio dos jesuítas, além da cadeia e a sede do governo. Desde o final século XVIII, argumentava-se que o morro atrapalhava a circulação de ar e causava inúmeras doenças. Além do mais, era considerado um estorvo para a expansão da cidade. Essa visão sobre o morro do Castelo se arrastou pelo século XIX até 1920, fazendo com que o Castelo de “Colina Sagrada” virasse “Dente Cariado”, pois, era interpretado como a fronteira entre a cidade colonial e a moderna, o que deu origem a uma preocupação de como a cidade seria avaliada pelas autoridades internacionais e pelos investidores estrangeiros, que viriam ao Rio de Janeiro, então Capital Federal, em 1922.

Até o seu arrasamento em 1922, o morro, berço inaugural da cidade, recebeu diferentes nomes

Mas a gestão de Carlos Sampaio não se limitou ao desmonte do Castelo, aliás, se desdobrou outros lugares da cidade, portanto, envolveu o embelezamento e o saneamento da Lagoa Rodrigo de Freitas, uma região considerada foco de doenças; obras de canalização do rio Maracanã e a construção da avenida com o mesmo nome; a constituição do bairro da Urca; a recuperação da orla de Copacabana e a abertura da Avenida do Contorno do Morro da Viúva, atual Avenida Rui Barbosa, entre outras obras importantes de calçamento, reposição, reparos e conservação.

Assim, no lugar do morro foi organizada a Exposição Comemorativa do Centenário da Independência, que contou com a participação de países estrangeiros e milhares de pessoas. Alguns dos pavilhões construídos para a mostra ainda existem como o Museu da Imagem do Som, a Academia Brasileira de Letras, o Museu Histórico Nacional e o Serviço de Saúde dos Portos.

Com o fim da mostra internacional em 1923, a região foi sendo gradativamente ocupada e no lugar da colina surgiu a Esplanada do Castelo com seus inúmeros edifícios. Em frente à igreja de Nossa Senhora de Bonsucesso encontramos o início da Ladeira da Misericórdia, que foi a principal via de acesso ao morro e a primeira rua calçada da cidade. Apesar de não levar a lugar a algum, é um registro material curioso da história da cidade. Além disso, ainda hoje se comenta sobre os tesouros dos jesuítas escondidos no subsolo do Morro do Castelo, uma lenda urbana que mobiliza o imaginário de muitos cariocas. Não por acaso, a história foi alvo da pena do escritor Lima Barreto num conjunto de reportagens para o jornal Correio da Manhã em 1905.


Antonio Edmilson Martins Rodrigues é historiador e professor da UERJ e da PUC-Rio. Autor de “A costura da cidade: a construção da mobilidade carioca” (Bazar do Tempo, 2016); “João do Rio: a cidade e o poeta: o olhar de flâneur na belle époque tropical” (FGV, 2000), entre outros. Facebook: Antonio Edmilson Rodrigues

Luciene Carris é pesquisadora e historiadora formada pela UERJ. Autora do livro “Histórias do Jardim Botânico: um recanto proletário na zona sul carioca (1884-1962)” (Telha, 2021), entre outros. Instagram: @lucienecarris