Nas entrelinhas da notícia

Religiões self service

*Por Professor Hélvio Costa

De uma forma geral, as religiões, sejam orientais, sejam ocidentais, têm-se mantido fiéis aos seus propósitos, quais sejam, dar respostas a questões existenciais. O homem é um ser religioso e é justamente na religião que ele vai buscar tais respostas.

O hinduísmo continua fiel aos seus quatro princípios (crença no Dharma, na reencarnação, busca da moksha-salvação, existência do carma); O budismo segue fiel às suas quatro nobres verdades; As religiões africanas primais, fiéis ao seu deus-criador e aos seus deuses, as secundárias, ligadas às forças da natureza; O judaísmo, por sua vez, continua aguardando o messias, guardando suas tradições e língua; O islamismo segue crendo no Deus único e principalmente no Corão, livro que encerra os ensinamentos de Alá ao profeta Maomé; O espiritismo está consolidado na doutrina fundamentada na crença na situação do homem como um espírito preso ao corpo, compreendendo a alma como condição do espírito enquanto permanece ligado ao corpo, e na crença na reencarnação.

Em um contexto de pós-modernidade, a discussão é bem outra, ou seja, procura-se entender e compreender as causas e as tendências desta espécie de “ressurgimento religioso”, principalmente no meio protestante neopentecostal, “ressacralização”.

Os novos movimentos religiosos surgidos nas últimas décadas é um dos elementos que mais salta aos olhos nesse período, o que corrobora o argumento de que a teoria da secularização não foi exitosa, de modo que, de tanto proclamar a morte da religião, agora, ao seu turno, talvez seja o seu fim. Notamos um crescimento explosivo na diversidade religiosa, sobretudo em uma perspectiva neopentecostal.

Essa situação possibilita cada vez mais o surgimento de uma “religião à la carte” desenhada de acordo com as preferencias individuais, mais do que seguindo a lógica e a coerência de um sistema doutrinal.
Contudo, apresentam uma nova escala de valores simbólicos e continuam buscando o sentido da vida, o que as mantém fortemente vinculadas às definições clássicas de religiões.

O que assistimos atualmente é o surgimento de novas formas de religião com expressões nos níveis individual, grupal e social. E, o movimento evangélico, como uma subespécie derivada do cristianismo que, por sua vez, deriva do gênero religião, é o que mais contribui para essa diversidade e consequente desvinculação da tradição fundante. Vemos a cada dia uma religiosidade permanente e exuberante, a mostrar que modernidade e religião não são incompatíveis. Porém, essa efervescência religiosa revela um abandono da tradição fundante juntamente com a mudança de alvo, ou seja, mudança de vida eterna no Reino para uma vida próspera no mundo.

Uma característica neopentecostal é a midiatização do culto mediante a intensa utilização do discurso de satisfação, mudando-se, com isso, a lógica do discurso fundante. Esse culto, que passa a ser uma mercadoria, deve gerar audiência, e seu discurso não pode ser o por vir, o etéreo ou imaterial, e sim o momentâneo, imediato e prazeroso. A mídia é extremamente cara, o aluguel dos templos igualmente caros, o que torna necessária a criação de produtos evangélicos para dar condição de continuidade das atividades religiosas. Essa prática se confunde com outra tão combatida por Lutero, qual seja, a venda de indulgências.

Essa necessidade de recursos leva a hermenêuticas tendenciosas, como, por exemplo, a usurpação da benção Abraão, exclusiva do povo hebreu, mas agora extensiva à Igreja. A prática de campanhas de cura com entrega de envelopes.

O neopentecostalismo pós-moderno enfatiza o eu (indivíduo) e cria uma nova realidade ou novo universo simbólico. O discurso emitido será sempre ressignificado a partir dessa nova realidade simbólica de cada indivíduo. Isso representa uma ruptura definitiva com a teologia medieval, pois traz em si características humanísticas da valorização do eu antropológico.

O Moderno indubitavelmente quebra paradigmas de conhecimento iniciado na tradição. Porém, o Pós-moderno é a consciência de que o homem não é só razão, é também emoção e sentimentos. Por isso, a construção do discurso religioso cristão neopentecostal busca satisfazer essa necessidade emocional do eu.


Professor Hélvio Costa é jurista e professor universitário

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