*Por Flávio Cure
Pesquisadores identificaram um novo mecanismo que pode explicar os benefícios cardiovasculares do uso diário de estatinas em pessoas vivendo com HIV. O estudo, conduzido por uma equipe do Mass General Brigham, nos EUA, foi publicado no renomado periódico científico JAMA Cardiology.
A descoberta é um avanço significativo, pois aponta para uma possível estabilização de placas arteriais, reduzindo os riscos de rupturas que levam a eventos cardiovasculares graves. A população vivendo com HIV enfrenta desafios únicos em relação à saúde cardiovascular.
Estudos anteriores demonstraram que esses indivíduos apresentam placas não calcificadas em maior quantidade e com maior propensão à ruptura. Essas características aumentam o risco de derrames, ataques cardíacos e morte súbita em idades mais precoces.
Dr. Steven Grinspoon, autor sênior do estudo e chefe da Unidade de Metabolismo do Massachusetts General Hospital, enfatizou a importância dessas descobertas. Ele destacou que entender os benefícios das estatinas nesse grupo específico pode abrir caminho para novas terapias mais direcionadas.
O estudo analisado faz parte do ensaio clínico de Fase III conhecido como REPRIEVE (Randomized Trial to Prevent Vascular Events in HIV).
Esse ensaio clínico demonstrou que o uso de pitavastatina, uma medicação redutora de colesterol, reduziu em 36% o risco de eventos cardiovasculares adversos ao longo de um acompanhamento médio de 5,6 anos.
Esse impacto foi maior do que o esperado apenas pela redução de colesterol, sugerindo outros mecanismos em ação. Na análise secundária mais recente, os pesquisadores examinaram 255 proteínas diferentes no sangue de 558 participantes do estudo REPRIEVE.
Eles descobriram que a pitavastatina aumenta os níveis da enzima PCOLCE, que desempenha um papel essencial na produção de colágeno. O colágeno é um componente crítico na estabilização de placas arteriais, reduzindo sua vulnerabilidade à ruptura.
Além disso, os dados mostraram que a abundância de PCOLCE está associada a uma redução das placas não calcificadas. Simultaneamente, foi observada uma formação maior de placas fibrosas, que são mais estáveis e menos propensas a causar complicações graves.
Esses efeitos ocorrem em conjunto com a redução do conteúdo lipídico nas placas, o que ajuda a prevenir sua ruptura. Essas descobertas expandem significativamente nosso entendimento sobre os benefícios das estatinas.
Outro ponto destacado pelo estudo é que os benefícios da pitavastatina podem ser aplicáveis também a pessoas sem HIV.
Embora mais pesquisas sejam necessárias para validar essa generalização, as implicações são promissoras para a saúde pública em geral.
Os pesquisadores acreditam que essas descobertas podem contribuir para o desenvolvimento de terapias adicionais que complementem o uso de estatinas.
Essas terapias poderiam focar na estabilização de placas arteriais, fornecendo uma abordagem mais abrangente para reduzir riscos cardiovasculares.
Ao longo do estudo, o acompanhamento rigoroso dos participantes e o uso de tecnologias avançadas permitiram uma análise detalhada dos efeitos das estatinas no organismo. Isso reforça a importância de investir em estudos de longo prazo para entender os impactos de medicamentos em populações específicas.
As estatinas, amplamente utilizadas para reduzir o colesterol, agora mostram um potencial ainda maior. Além de controlar os níveis lipídicos, elas podem desempenhar um papel crucial na proteção contra eventos cardiovasculares em grupos de alto risco.
Essa pesquisa reforça a relevância do manejo proativo da saúde cardiovascular, especialmente em populações vulneráveis como as pessoas vivendo com HIV. Os resultados destacam a importância de um cuidado médico individualizado e baseado em evidências científicas.
Com base nessas descobertas, espera-se que futuras diretrizes médicas considerem esses mecanismos ao recomendar tratamentos para saúde cardiovascular. A integração de estratégias mais personalizadas pode melhorar a qualidade de vida e reduzir complicações em longo prazo.
Em resumo, os avanços proporcionados por estudos como este não apenas ampliam nosso conhecimento científico, mas também oferecem novas perspectivas terapêuticas. A saúde cardiovascular continua a ser uma prioridade global, e descobertas como essa representam um passo importante para melhorar os cuidados médicos.
Flávio Cure Palheiro é cardiologista, coordenador do Centro de Estudos do Hospital Copa Star.
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