A Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), promoveu na segunda-feira (25), um seminário para debater violência obstétrica e as mortes maternas no estado. Durante o encontro, diversas mulheres relataram casos de violência obstétrica nas clínicas e maternidades públicas do Rio.
A presidente da Comissão da Alerj, deputada Renata Souza (Psol), destacou que atuará de forma conjunta com a comissão da Câmara dos Deputados, representada pela deputada Taliria Petrone (PSol), e com a Câmara dos Vereadores da Cidade do Rio para fiscalizar o atendimento e garantir o cumprimento da legislação.
“Nós já temos diversos instrumentos, como o relatório final da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do Hospital da Mulher de Cabo Frio, que recomenda a instalação de uma ouvidoria no estado destinada a receber denúncias de violência obstétrica e das comissões de óbitos nos hospitais”, exemplificou a parlamentar.
“Tratamos hoje de vários temas que já tínhamos levantado nessa CPI e a gente não precisa de ‘retrabalho’. A gente necessita que as leis e as recomendações que já existem sejam respeitadas”, afirmou, citando ainda a tramitação, na Alerj, de projetos como o que pretende criar centros de parto normal com recursos do Fundo Estadual de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres.
Durante o encontro, o coordenador da área de Saúde das Mulheres da Superintendência de Atenção Primária à Saúde da Secretaria de Estado de Saúde (SES), Antônio Rodrigues Braga Neto, reconheceu a existência de casos de violência obstétrica no Rio e destacou a implementação de medidas para redução dos mesmos, como ações de conscientização regulares com as equipes.
Braga também explicou que o Estado do Rio apresentou uma redução nos índices de morte materna em 2023, mas, ainda assim, foram registrados 123 casos nos hospitais públicos, sendo que 75% deles ocorreram na região metropolitana, na capital e na Baixada Fluminense. “As principais causas são hemorragia, hipertensão e infecção”, comentou.
Ele destacou, ainda, que o Rio será o primeiro estado do Brasil a implementar um protocolo de suplementação de cálcio para gestantes, já que a deficiência deste nutriente está entre as causas da hipertensão na gravidez. “As mulheres fluminenses têm um consumo em média de 400 mg por dia de cálcio, quando o recomendado é de 1,5 grama”, afirmou.
A presidente da comissão adiantou que vai solicitar à Secretaria de Saúde o acompanhamento semanal dos dados sobre mortes maternas e violência obstétrica no estado.
Realização de procedimentos sem anestesia, ofensas, falta de orientação médica e até mesmo negligência dos profissionais de saúde foram alguns dos relatos apresentados pelas mulheres vítimas de violência obstétrica que acompanharam a audiência. Parte delas chegou à Alerj após conhecer a Sala Lilás, espaço destinado ao acolhimento e à orientação para quem já sofreu alguma violência.
Representando o coletivo Mães de Itaboraí, Ariane Magalhães contou histórias de algumas das vítimas. “Uma jovem de 23 anos teve seu parto bem-sucedido, mas faleceu pouco tempo depois porque uma médica esqueceu de retirar toda a placenta do corpo dela. Eu recebo relatos de mães que já ouviram no hospital que ‘a carne da mulher preta é igual couro de vaca’. É evidente que essa violência é por causa da nossa cor, do nosso gênero, da nossa classe social”, desabafou.
A enfermeira obstétrica Rosana Côrrea, que atua com mulheres em privação de liberdade, afirmou que casos como os relatados remontam às práticas do “pai da ginecologia”, J. Marion Sims, que, no século XIX, realizava procedimentos cirúrgicos em mulheres negras sem anestesia, “pois acreditava que a mulher negra não sentia dor”. “Pouco tempo depois, ele realizou os mesmos procedimentos em pacientes brancas, mas dessa vez com anestesia”, concluiu ela durante o evento na Alerj.
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